Por Marcelo Szpilman*
Há anos abordo o tema tubarões em meus artigos e palestras e sempre me surpreendendo como o assunto continua provocando o mais comum dos transtornos de ansiedade: a fobia.
Apesar de ser a forma mais segura de locomoção, voar de avião faz aflorar sentimentos semelhantes aos provocados pela figura do tubarão. Voar num jato comercial é muito mais seguro do que trafegar nas ruas e estradas das grandes metrópoles. É cerca de vinte vezes mais provável que você morra em um acidente de carro indo para o aeroporto do que após embarcar em um avião. Mas as pessoas tendem a ter muito mais “medo” de voar do que de andar de carro ou de ônibus. Da mesma forma, em se tratando de morte por ataque de tubarão na praia, é muito mais provável que você morra indo até a praia do que já estando nela. E é ainda mais provável que você morra na areia da praia do que após entrar na água para se banhar.
Mais uma vez, ao escrever esse artigo, meu objetivo é desmitificar a imagem sensacionalista e irreal dos tubarões como “feras assassinas dos mares”, que logo vem à mente de muitas pessoas, e convencê-lo de que os tubarões exercem um importante papel na manutenção da saúde e do equilíbrio dos ecossistemas marinhos e que também merecem e precisam ser protegidos e preservados.
Ter medo de um animal ameaçador é absolutamente normal. O medo é um componente importante para a nossa sobrevivência. No entanto, quando se perde o controle sobre o medo e ele se torna desproporcional à ameaça, tem-se a fobia. E somente a fobia explica o comportamento irracional diante da imagem do tubarão, pois o real perigo que eles representam está muito aquém do que é comum imaginar. Longe disso. Interagir de forma amistosa com esses seres fantásticos é não só perfeitamente possível como bastante prazeroso.
Mergulhar com tubarões, como eu e muitos mergulhadores fazem em áreas específicas ao redor do Planeta, é muito mais seguro do que inúmeras atividades esportivas ou recreativas, como o voo de asa-delta, o paraquedismo, o ciclismo ou até mesmo o futebol americano (veja abaixo a lista das 20 causas de morte mais prováveis do que por ataque de tubarão). Sempre insisto em uma comparação que exemplifica a diferença de interação e potencial de risco. Se você passar ao lado de um grande predador, como o crocodilo, o leão ou o tigre, e ele estiver com fome, há 100% de certeza de que ele o verá como uma presa e irá atacar e te devorar. No entanto, você pode mergulhar com um tubarão sem saber se ele se alimentou nos últimos dias e, com certeza, ele irá te respeitar e não atacará.
Infelizmente, a fobia coletiva continua contribuindo para que a sociedade não se preocupe com a pesca predatória e o consumo insustentável dos tubarões. Atualmente, cerca de 100 milhões de tubarões são capturados e mortos a cada ano em todos os mares, em grande parte para obtenção exclusiva das nadadeiras (finning) que irão prover o lucrativo mercado oriental de sopa de barbatana de tubarão. Isso representa uma monumental ameaça à sobrevivência dos tubarões e está levando muitas populações ao declínio vertiginoso. E é aí que chegamos a um ponto importante, já que para convencer as pessoas a proteger e preservar os tubarões não basta falar em matança cruel e extinção em massa. É preciso explicar qual é o papel dos tubarões no ecossistema marinho e o quanto sua falta influenciará no bem-estar da humanidade.
Os tubarões exercem duas funções primordiais no meio ambiente marinho. Primeiro, como predadores situados no topo da cadeia alimentar, o equivalente oceânico aos leões africanos e tigres asiáticos, os tubarões asseguram um tipo de ordem nos oceanos. Mantêm o controle populacional de suas presas habituais e exercem importante papel na seleção natural ao predar os mais lentos e os mais fracos. Em segundo, ao comerem os animais e peixes doentes, feridos ou mortos, exercem também uma função extremamente importante na manutenção da saúde dos oceanos. Para entender melhor o que isso significa basta ver a semelhante função do urubu no ambiente terrestre. Os urubus, assim como os grandes carniceiros, consomem um cadáver (de qualquer animal que morre na natureza) em questão de minutos. Se acabássemos com os grandes carniceiros terrestres, as carniças passariam a ser consumidas somente por insetos, bactérias e micróbios, que levariam dias ou semanas nesse intento. O nível de microrganismos no ar que respiramos seria insuportável e insalubre. No mar acontece a mesma coisa. Sem esses guardiões dos mares, teremos um ambiente marinho doente, frágil e com desequilíbrios ambientais imprevisíveis que podem representar graves consequências para nossas vidas e atividades comerciais.
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